janeiro 12, 2012

Friuli-Veneza Giulia e Strucolo di Ricota

*Receita no final do post

As lareiras, com o fogo à lenha sob a coifa, no centro da cozinha; ao redor os bancos escuros, as estantes com as cerâmicas, as chaleiras e formas de cobre, os estanhos, os bronzini (caldeirões) de três pés, as rústicas madeiras claras. É o fogolàr friulano. Mas é muito mais que uma lareira. É o centro da casa, é a cozinha, a sala, o lugar de encontro, o ponto de referência da nostalgia.

Essa atmosfera calorosa, intensamente “vivida”, reflete o caráter genuíno e artesanal da gente friulana, do Piave a Gorizia, de Carnia ao Collio, e se reflete na vigorosa gastronomia, feita com genuinidade e paciência, de sabores honestos e antigos. Como no vizinho Vêneto – de cuja região Friul-Veneza Júlia é irmã legítima -, o arroz, o milho, o feijão, as hortaliças e as ervas aromáticas, as carnes deliciosas, em particular a de porco e as de caça. Ao longo da costa, desde Lignano a Acchileia e Grado, até Trieste e Muggia, peixes de primeira qualidade, à maneira veneziana. Aqui o Leão de São Marcos[1] não é apenas uma memória histórica. Sobre a base veneziana, há interessantes influências gastronômicas austríacas, eslavas, húngaras e até mesmo gregas. Disto resulta uma extraordinária culinária vêneta-mitteuropéia[2] que ao “comer verde”, agrega o gosto forte do rábano, pó picante da páprica, o doce das geleias de frutas dos pomares e de frutas silvestres, e as sementes de papoula, de cominho, de anis e as azeitonas.

Poucas são as massas secas (bígoli, cialzòns, strùcoli, gnocchi), mas condimentadas ou recheadas com sabores excepcionais, muitas vezes doces. Muitos risotos e polentas, reforçados por carnes ou peixes; e as minestras, de feijão, verduras, cevada, milho, farinha, com caldo ou leite. Não se pode deixar passar: a robusta iota triestina e o minestrone de bòbici (milho verde), a sopa de feijão e a bisna friulana, o borèto de Grado e as outras sopas de peixes.

Entre as carnes, além da variedade de caças, os assados com ervas, o clássico fígado ao forno, os gansos e as aves, o gulasch, o sguazzetto de cordeiro, o molho de vitela ao forno, os cevàpcici. Os tantos outros modos de preparar os saborosos peixes do Alto Adriático, e no interior, as trutas.

Magníficos os acompanhamentos de vegetais, aspargos, espinafre, radicchio roxo e radite verde de Gorizia, brovada carnica (nabo branco com vinaccia), topinambur (tubérculos de alcachofra de gosto suave).

De alta classe são os salames: os vários tipos de presunto (o autêntico e delicadíssimo San Daniele, o pequeno Sáuris defumado, o magro e saboroso Carso, e o presunto cozido ao forno, de Trieste); as lugàneghe, as sorpresse, o robusto musetto, salsichões onipresentes em fortes minestras.

Entre os queijos, são fundamentais o Montasio della Carnia, frescos ou maduros; de qualidade a puìna (ricota) também defumada, o pecorino, também condimentado com anchovas. Grande confeitaria, do tipo vêneto, eslavo e mitteuropeo, geralmente cheia de frutas, uvas passas, frutas cristalizadas, chocolate: strùcolo triestino, gubàna carnica, Koch, foccacia de papoula, bussolài, pinze, sopes indorades, morangos fritos, gnocchi de ameixa-secas. De merecida fama, as grapas e os destilados de ameixas.

Ainda mais ilustres são os vinhos: os tintos Pinot Nero, Refosco, Merlot, Cabernet, Terrano del Carso, Pucino Rosso, e os Vini del Collio. Os brancos: Pinot Grigio e branco, Verduzzo, Pucino, Tocai, Prosecco, Sauvignon, Malvasia, Sylvaner, Ramandolo, Traminer. Para as sobremesas, os raros Picolìt, o Verduzzo doce, o Prosecco e o Refosco espumante. Antes do almoço e da janta a veneta “ombra” de vinho branco, que em Friuli se chama “tajùt”.

Strucolo di Ricota
Receita daqui

Ingredientes

300 gramas de farinha de trigo
03 colheres (sopa) de azeite de oliva
água morna

300 gramas de ricota sem sal - se tiver a fresca-fresquinha melhor
120 gramas de manteiga
70 gramas de açúcar refinado
01 colher (sopa) de farinha de rosca
Casca de 01 limão
01 gema
50 gramas de uva passas - usei damascos, pois estava com preguiça de ir ao mercado para comprar as uvas (!)
Açúcar de confeiteiro para decorar

Coloque a farinha na superfície de trabalho, faça um buraco no centro, coloque o azeite e água morna (pouca). Amasse até ficar uma massa homogênea, lisa. Vá acrescentando água aos poucos. A massa deve ser consistente. Cubra e deixe descansar por 30 minutos.

Em uma tigela amasse a ricota. Se preferir passe por uma peneira. Acrescente 90 gramas de manteiga derretida, o açúcar, as raspas de limão e as uvas passas. 

Abra a massa bem fininha com a ajuda de um rolo. Deve ficar mais fina que a minha. Pincele a gema sobre a massa, espalhe o recheio de ricota e enrole como um rocambole, cuidando para não sair recheio pelas extremidades. Coloque em uma forma untada. Pincele o restante da manteiga sobre a massa.  (O processo é igual ao do strudel.)

Asse em forno pré aquecido a 200ºC por 30 minutos. Retire do forno, polvilhe o açúcar de confeiteiro. Sirva morno ou frio.



[1] Símbolo de São Marcos, um dos quatro evangelistas. Teve o seu corpo levado de Alexandria para Veneza em 829. Por séculos o Leão de São Marcos foi o símbolo da República de Veneza.
[2] Da Europa Central


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6 comentários:

  1. Deve ficar uma maravilha! E até parece relativamente simples de fazer (não fosse a minha incapacidade para enrolar tortar, que ficam mesmo tortas, lol)

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  2. Carla, a viagem fica cada vez melhor! O que me saltou do texto foi o nhoque de ameixa seca, penso que deve ser muito bom :-) Adorei a receita, a massa deve ficar bem gostosa e o resultado parece ser muito leve. Sei lá, acho que fez bom negócio trocando as passas pelo damasco, e viva a preguiça :-) Beijos!

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  3. Nossa Carla, que visão deslumbrante. Será que consigo deixar essa massa bem fininha? Adorei essa receita e acho que na falta das uvas, o damasco fez uma bela e deliciosa presença junto à ricota. Vou levar a receita, gostei muito querida. Bjocas

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  4. Nunca provei nada parecido, tem um aspecto delicioso...tbm levo a receita e quem sabe me atreva a fazê-la!rs...
    Bj...

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